1000 dias: uma boa nutrição no início garante um futuro mais saudável!

Evidências dos últimos anos têm demonstrado que o bem-estar ao longo da vida depende do desenvolvimento e crescimento durante a vida intrauterina. Uma interação adequada e ajustada entre a placenta, a mãe e o feto pode levar a um potencial de crescimento. Fatores ambientais e maternais como a dieta materna, a composição corporal e o estado endócrino, podem alterar este equilíbrio.
Hoje vamos falar de nutrição e da sua importância durante os primeiros 1000 dias de vida, que são justamente os primeiros 3 anos de vida do bebé. Na verdade, deveríamos falar de 1100, sendo que os primeiros 100 seriam dedicados ao período que antecede a conceção e durante o qual a mulher se deveria preparar para a futura gestação. O que acontece durante estes dias é decisivo na saúde futura do bebé.
Uma investigação sobre a alimentação, nos primeiros meses de vida, observou uma prevalência aumentada de obesidade em crianças que nunca tinham sido amamentadas com leite materno. Outros estudos confirmam estes resultados, concluindo um efeito protetor do leite materno sobre o risco de excesso de peso e obesidade.
Acima de tudo, a alimentação dos lactentes influencia o crescimento e desenvolvimento, mas também a incidência de doenças respiratórias, gastrointestinais e alérgicas, tanto na primeira infância, como na juventude e na idade adulta. Este é um sério compromisso se queremos obter, no futuro, gerações mais saudáveis e se pretendemos diminuir o risco das doenças crónicas não transmissíveis.
Uma nutrição adequada é resultante do equilíbrio entre a energia ingerida versus a energia gasta nas atividades. No caso do bebé, esta questão contabilística da energia não se coloca da mesma forma como num adulto. O balanço energético para um bebé, ou criança de pouca idade, tem de ser positivo, de modo a garantir a energia e os nutrientes necessários à formação de novos tecidos e garantir um crescimento saudável.
Aleitamento materno & introdução de novos alimentos
Ao nascimento e apesar das suas limitações fisiológicas, metabólicas e imunológicas o bebé tem necessidades energéticas muito elevadas. Durante o primeiro ano de idade a taxa de crescimento é substancialmente elevada, e a principal necessidade do lactente é a energia.
Se as necessidades energéticas estiverem satisfeitas, através das gorduras e dos hidratos de carbono, durante o primeiro semestre de vida a dependência de energia é muito mais por via das gorduras, sendo que no segundo semestre esta dependência inverte-se ganhando os hidratos de carbono uma maior importância como fonte de energia rapidamente disponível – e não menos importante se a qualidade e quantidade proteica forem adequadas. Se os minerais estiverem presentes nas quantidades desejáveis e adequadas, o bebé vai crescer de forma saudável e harmoniosa.
Nesta fase, a função da proteína é crucial, prioritária e responsável pelo fornecimento de nutrientes adequados para a construção dos vários tecidos.
O leite materno em exclusivo, durante os 6 primeiros meses de vida, é sem dúvida o melhor garante de um crescimento adequado e continua a ser um alimento completo, vivo e um desafio constante para a investigação. Proporciona todos os nutrientes necessários macronutrientes tais como: proteína em adequada quantidade e elevada qualidade, gorduras de excelente absorção e hidratos de carbono dos quais lactose e oligossacáridos do leite humano (HMOs) e ainda micronutrientes. Esta composição única diminui a exposição a antigénios, previne contra infeções gastrintestinais, promove a maturação da função barreira e desenvolve a flora intestinal, além de conferir ainda ao bebé inúmeros efeitos benéficos do ponto de vista do sistema imunitário. Um super-alimento, portanto.
Contudo a partir de um dado momento, o leite materno só por si não consegue fazer face às elevadas necessidades energéticas deste intensivo período de crescimento. Este momento não é rígido, sendo consensual por diversas entidades científicas que aconteça entre o final do 4º e o 6º mês de idade. Por esta altura o bebé já tem maturidade suficiente, gástrica e digestiva para aceitar novos alimentos.
Sopa ou papa, qual a melhor escolha?
Tanto a sopa como a papa são alimentos fundamentais durante este período e independentemente da ordem pela qual se começa serão alimentos que se complementam. A sopa será uma forma de testar novos sabores que são necessários treinar, além de que será necessário adicionar uma fonte proteica e uma fonte lipídica.
Os cereais devidamente transformados e forificados, vulgarmente conhecidos por papas infantis, são essenciais na alimentação do bebé, uma vez que compensam a energia que no leite já não é suficiente, sendo corretamente adequados. Os cereais contêm nutrientes importantes, tais como hidratos de carbono, fibras, lípidos, proteínas de origem vegetal, ácidos gordos essenciais, minerais (essencialmente ferro) e vitaminas do complexo B, proporcionando uma ótima saciedade.
As papas infantis têm ainda a grande vantagem de serem uma forma extremamente suave de fazer a transição entre uma alimentação rica em gordura e uma alimentação rica em hidratos de carbono.
Alimentar: mais do que dar de comer
O próximo passo é a carne, em pequenas quantidades, cerca de 10-20 g ao dia, fundamental para fornecer ferro heme (muito mais facilmente absorvido), uma vez que por volta dos 6 meses já se faz sentir a sua falta. Pode também por esta altura introduzir-se a fruta fornecedora de vitaminas e minerais. No início, é preferível dar a fruta de forma individual para que o bebé aprenda a conhecer os sabores isolados e não apenas uma mistura de frutas.
Entre os 7 e os 9 meses de idade dá-se a introdução de outros alimentos e texturas para promover a mastigação e todo o processo de aprendizagem. O peixe é uma ótima fonte de proteína e de ácidos gordos; os alimentos lácteos são uma excelente fonte de cálcio e o ovo é uma excelente proteína de alto valor biológico.
Dos 9 aos 12 meses, pode-se introduzir outros alimentos, as leguminosas secas tais como ervilhas, feijão, grão, que são ótimas fontes de proteína vegetal, fibra e minerais.
É fundamental que os pratos oferecidos ao bebé sejam variados e que contemplem todos os grupos da roda dos alimentos. Alimentar é muito mais do que dar apenas comida, é uma forma de promoção de saúde. Outro aspeto muito importante é a consistência dos alimentos que vai oferecendo ao bebé. Evolui de uma textura puré cremosa para uma com pequenos pedacinhos , estimulando igualmente a mastigação.
Porque é que se diversifica?
Se não diversificássemos a alimentação o volume de leite necessário seria incomportável para a sua pequena barriguinha, já que a capacidade gástrica de um bebé não tem nada a ver com a de um adulto. È muito reduzida no inicio e vai aumentando progressivamente.
Os bebés não são mini-adultos:
- Habitualmente consomem um grupo de alimentos mais reduzido e menos variado;
- Têm diferentes sensibilidades (tolerâncias e capacidade gástrica) comparativamente aos adultos;
- Os alimentos que oferecemos nesta fase devem ser ricos do ponto de vista nutricional e
- preparados com ingredientes seguros
Estes primeiros 1000 dias de alimentação de que falamos serão cruciais para cuidar da saúde futura do seu bebé. É neste momento que queremos introduzir hábitos alimentares saudáveis para que estes se possam prolongar para sempre, moldando o comportamento e garantindo um crescimento adequado. Ajude o seu filho a crescer de forma saudável.
*Nota: A ordem e a sequência de introdução dos alimentos é apenas uma orientação, que não dispensa de forma alguma a orientação do profissional de saúde que acompanha o bebé.
Helena Canário
Nutricionista (Medical Scientific Relations Manager – Infant Nutrition / Nestlé Portugal)